quarta-feira, 26 de setembro de 2007

DOS DELITOS E DAS PENAS – BECCARIA (PARTE XII)


Chegamos agora à penúltima análise de obra de Beccaria. Talvez, ao lado do final do livro, a parte mais magistral da obra. Nesta seção, Beccaria trata da importância de prevenirmos o crime. Ele dá início à sua abordagem sobre o tema com uma declaração incontroversa: “É melhor prevenir os delitos do que puni-los. É este o escopo principal de toda boa legislação, que é a arte de conduzir os homens ao máximo de felicidade ou ao mínimo de infelicidade possível, conforme todos os cálculos dos bens e dos males da vida”. Num contexto em que a classe média brasileira encontra-se em busca de soluções simplistas no campo da segurança pública, em que muitos dizem que a solução está em termos mais “Carandirus” e que o negócio é tão somente matar o bandido, esta declaração nos traz à memória o fato de que melhor é prevenir a prática do crime do que punir o culpado. Note que ele não está falando que não se deve punir. O que não podemos fazer é fomentar a prática do crime, deixando de combater a miséria, perpetuando a cultura do vale tudo e mantendo leis frouxas (veja que esta é uma discussão que precisamos ter, especialmente aqueles que em nome dos direitos humanos, apóiam uma legislação penal que não exerce poder algum de coerção sobre o espírito humano: até que ponto leis que não infligem temor, não tornam a vida do candidato em potencial à prática do crime, mais exposta ainda ao sofrimento, já que se ele temesse a lei, não praticaria o que o conduz à trágica experiência de ter que parar numa prisão?), e mantermo-nos preocupados apenas em punir.

Beccaria é realista: “Não é possível reduzir a turbulenta atividade dos homens a uma ordem geométrica sem irregularidade e confusão”. Muitas vezes ficamos em busca de soluções que não tenham o elemento do trágico. Num mundo malvado como este, que se tornou complexo devido à nossa incapacidade de amar, jamais encontraremos soluções fáceis, e, que, deixem de trazer perplexidade e angústia à nossa alma, por vermos um mal ser solucionado a partir da adoção de um outro mal, como, por exemplo, diminuir a violência nas nossas cidades mediante a promulgação de leis mais rígidas, de aplicação rápida e certa, o que inevitavelmente trará mais sofrimento para o malfeitor. Confesso, que gostaria de viver num mundo onde as coisas não fossem assim.

As leis devem ser razoáveis. Não devemos botar os seres humanos num torno. Levá-los a viver uma vida contrária à natureza, remetendo-os assim, a prática de crimes que são categorizados como tais, por tão somente haverem sido estabelecidos de modo arbitrário como práticas ilegais. Não devemos legislar em cima de tolices. Diz Beccaria: “Proibir uma grande quantidade de ações diferentes não é prevenir os delitos que delas possam nascer, mas criar outros novos, é definir arbitrariamente a virtude, e o vício, que nos são apresentados como eternos e imutáveis... Para cada motivo que impele os homens a cometer um verdadeiro delito, há mil outros que os impelem a cometer aquelas ações indiferentes que as más leis chamam delitos; e se a probabilidade dos delitos é proporcional ao número dos motivos, ampliar a esfera dos delitos é aumentar a probabilidade de que sejam cometidos”.

Quando as leis são boas a ponto de serem úteis para a prevenção de delitos? Beccaria responde: “Quereis prevenir os delitos? Fazei com que as leis sejam claras, simples e que toda a força da nação se concentre em defendê-las e nenhuma parte dela seja empregada para destruí-las. Fazei com que as leis favoreçam menos as classes dos homens do que os próprios homens. Fazei com que os homens as temam, e temam só a elas. O temor das leis é salutar, mas o temor de homem a homem é fatal e fecundo em delitos”. Que luz uma declaração como esta lança sobre os nossos problemas no campo da segurança pública?

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