terça-feira, 9 de janeiro de 2007

O CHAMADO DIVINO PARA A VERDADEIRA UNIDADE DA IGREJA


Se há uma pessoa que deve procurar zelar pela manutenção do espírito ecumênico evangélico, essa pessoa sou eu. Fui evangelizado por pentecostais, recebi minha primeira Bíblia das mãos de irmãos metodistas wesleianos e fui convertido por presbiterianos num retiro realizado nas dependências de um seminário luterano. A primeira vez que ocupei o púlpito de uma igreja foi numa base missionária batista na Ilha Grande. Plantei uma igreja em Niterói nas dependências de uma igreja Episcopal. Durante anos realizei os cultos da Igreja Presbiteriana da Barra no templo de uma igreja independente de nome Union Church. Há mais de vinte anos oro com os irmãos da Assembléia de Deus de Arraial do Cabo, os quais Deus usou para certificar-me do meu chamado ministerial. O presbítero mais antigo da igreja onde sou pastor é um convertido da Igreja de Nova Vida. E poderia mencionar tantos outros exemplos mais que têm me convencido do fato de que sou devedor a todos.

Confesso, contudo, que hoje me sinto decepcionado com o que está acontecendo em todas as denominações evangélicas de nossa nação. A começar pela minha denominação e pelos seguidores da tradição teológica que abracei. Quando olhamos para o passado, nos lembramos de homens tais como João Calvino, Francis Turrentin, Jonathan Edwards, Thomas Watson, Richard Sibbes, Thomas Goodwin, B. B. Warfield, Charles Hodge, Martyn Lloyd-Jones. Enfim, uma nuvem de testemunhas. Homens que edificaram nações, lutaram pela democracia, investiram em ciência, promoveram as artes, fundaram universidades e espalharam o evangelho pelo mundo inteiro. A minha pergunta é: o que faz com que seguidores de um passado tão extraordinário não manifestem no presente a beleza da vida dos seus predecessores? E quando olho para as demais igrejas meu estado de estupefação é total. Sinto-me atônito. O que houve conosco? Nosso povo não conhece sua própria fé. Por exemplo, nossa gente não sabe encontrar a doutrina da Trindade na Bíblia. Há milhares de pessoas no nosso meio que não conseguem definir a doutrina da justificação pela fé somente, que, segundo Martinho Lutero, é o "artigo de fé mediante o qual uma igreja permanece de pé ou cai". Nosso povo é mais católico, espírita e muçulmano do que imagina. Somos uma igreja que está em busca de cultos agradáveis e que por isso não gosta de ser perturbada pelos sermões de seus pastores; um povo que freqüenta ansiosamente "reuniões de libertação", porém não gosta de Escola Dominical; uma igreja que vive em busca de experiências desprovidas do conteúdo da verdade.

Sou protestante. Faço parte de um movimento, iniciado no século XVI, que ansiava por uma igreja pura. Hoje esse espírito protestante foi banido do nosso meio. O que é lamentável, pois graças à Reforma a mensagem do evangelho foi preservada. Se Lutero, em nome do amor, tivesse permanecido em silêncio, continuaríamos rezando por parentes no purgatório, cultuando os santos, suando para ganharmos o amor de Deus e com nossas consciências nas mãos de um Papa. Vivemos numa era que não crê mais em verdades absolutas, farta dos exageros da inquisição e que tem como único princípio absoluto de vida a tolerância. E isso num contexto em que o nosso povo, desprovido de conhecimento teológico elementar, julga que pelo fato de uma igreja se dizer cristã ali o evangelho está sendo pregado. De fato, sinto que se ficar calado deixarei a história de amor mais linda e a verdade mais libertadora serem desfiguradas, levando os de minha geração a não conhecerem a beleza do evangelho do nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo. O evangelho emancipa a vida, faz o homem estudar, investir naquilo que o distingue dos animais irracionais, seu intelecto. Permite que seu coração seja tangido pela verdade que sua mente assimilou. E tudo isso levando-o à prática concreta da verdade. O evangelho na nossa nação não tem produzido as transformações sociais que sempre acompanharam, ainda que de modo indireto, as sociedades que foram atingidas pelo testemunho cristão protestante. Nossa presença nos campos missionários é insignificante. E 160 milhões de brasileiros permanecem do lado de fora da igreja, chocados com o que evangélicos têm feito em nome de Deus na nossa pátria. As pedras estão clamando. Às vezes vejo jornalistas não-crentes atacando pecados da igreja que deveriam deixar todos nós indignados também. Como em época de eleição um ministro interrompe um culto dirigido ao Deus Santo para anunciar a presença de um candidato no púlpito da igreja, passando-lhe em seguida a palavra?

O duro é que nós, pregadores, temos que fazer um corte na espiritualidade evangélica que exige grande habilidade e presença de amor cristão. Confesso que me sinto cheio de temor de entristecer a Deus, por um lado, por não falar e, por outro lado, por falar demais. Isso porque detecto a presença de três tipos de problemas teológicos em nossas igrejas. Primeiro, há aquilo que poderíamos chamar de indiferente. Certas noções teológicas ou comportamentos espirituais que não têm grandes conseqüências práticas para a vida da igreja. Como o tipo de batismo, por exemplo. Sem dúvida isso é mais fácil de discernir. Porém, em segundo lugar, existe o que poderíamos intitular de enfraquecedor. Doutrinas, tradições e conceitos de vida cristã que minam a vida espiritual da igreja e tornam o cristianismo feio. É aí que se encontra um dos principais problemas. Pois, nessa área para muitos cinzenta, encontram-se certos vírus difíceis de serem detectados, que não são mortais, mas são debilitadores. Não vejo outra alternativa, senão, sobre eles falar com brandura, mas, na minha própria igreja, usando da mesma forma de amor, pregar de modo explícito e até mesmo com veemência, pedindo que certas condutas e ensinamentos não entrem de forma alguma na nossa congregação, que hoje luta para ser reformada, pois acredito de todo o coração que "o calvinismo é o cristianismo que se achou" e "o estágio mais alto da evolução teológica da igreja". Incluo nessas práticas debilitadoras (a lista é interminável) as seguintes coisas:

Movimento G12. Não sou contra a igreja em células. Sou contra, depois de dois mil anos de história do cristianismo, pessoas forçarem igrejas a adotarem uma estrutura eclesiástica que não é absoluta, pois não tem a chancela do Novo Testamento. Sou contra colocar nas mão de leigos o ensino da igreja. Sou contra o que acontece nos retiros do G12 (sei que não é o que ocorre em todos os casos, mas às vezes vem dentro do pacote), nos quais pessoas são submetidas a práticas para as quais não há base bíblica alguma. A quebra de maldição é uma delas. Além de não ter sustentação bíblica, vai de encontro à razão, na medida em que faz com que problemas emocionais graves sejam tratados na base de passe de mágica. Cura interior é algo que se alcança mediante o conhecimento da verdade. O cristianismo desconhece libertação que não seja pela verdade. Maior probabilidade tem de viver uma vida emocional estável quem participa de reuniões de estudo bíblico do que quem vive atrás de experiências místicas de libertação. Os casos de pessoas que apresentaram melhora não servem. Nós, cristãos, não fazemos teologia em cima de experiência, mas da Bíblia. Caso contrário, não teríamos nada a dizer às seitas, cujos membros costumam apresentar relatos de experiências agradabilíssimas.

A aversão ao estudo da teologia. Para mim é triste ver pessoas que sabem mais sobre G12 do que sobre a Trindade. Conhecem melhor quebra de maldição do que a doutrina da regeneração. A igreja não passa do púlpito. Púlpito fraco, igreja fraca. O cristianismo é uma religião doutrinária. Para a fé cristã, em primeiro lugar vem o intelecto. A mente é esclarecida e depois o coração é tocado pela verdade. É uma glória quando a igreja é composta por crentes eruditos e ungidos.

E, por fim, em terceiro lugar, há ensinamentos que são letais. O liberalismo teológico é o principal deles. Basta dar uma olhada no estado das igrejas européias para nos certificarmos dos efeitos deletérios dessa heresia. O trabalho da igreja universal é outro que precisa ser denunciado como letal. Se crentes fiéis não erguerem a voz, os 160 milhões de brasileiros que não conhecem a Cristo continuarão do lado de fora da igreja. Se nós, evangélicos, continuarmos a chamar a igreja universal de CTI evangélico, a confusão se estabelecerá na mente do nosso povo e a morte do cristianismo na nossa terra será certa. Temo que o Espírito Santo se aparte de uma nação que tolera tamanha afronta aos céus.

Não incluiria a atual linha de espiritualidade vigente no Brasil in totum nesse meio. Esse modelo de vida cristã tem representado um resgate da obra do Espírito Santo, uma renovação na dependência de Deus em oração, um ataque ao ministério de um só homem e uma reação ao formalismo das igrejas históricas que parecem ter medo de avivamento. Mas já chegou a hora de se dizer que o a linha de espiritualidade predominante no Brasil é fraca teologicamente e apregoa uma espiritualidade infantil, legalista e que não desenvolve o ser humano por completo. A maior prova disso é a diferença entre a evangelização dessas igrejas em nosso país e a evangelização calvinista no passado. A diferença é tão gritante, que dificilmente um conhecedor da história do cristianismo conseguirá deixar de expressar ponto de vista análogo ao meu.

Os problemas intramuros que enfrentamos devem deixar tristes a todos nós. Quisera que não tivéssemos tantas divisões e que não precisássemos atacar doutrinas de outras igrejas. Mas não podemos! Vivemos em um mundo caído. Nada é fácil de administrar nesse presente estado de coisas. A igreja não está imune a isso. O Senhor Jesus alertou a todos nós que o inimigo haveria de semear joio no meio do trigo. Por isso, parte da mensagem da igreja será negativa. Denunciar o erro ao mesmo tempo em que se faz um anúncio positivo da verdade. Há também posturas infantis que não podem ser toleradas. Não podemos permitir que a vida da igreja seja dirigida pelos desejos daqueles que se encontram numa espécie de infância espiritual. Criança gosta de movimento, detesta disciplina, não se agrada de estudo e gosta de ser mimada. Se deixarmos, nossos cultos virarão meros momentos de entretenimento, sem nenhuma transcendência. Só espetáculo. Nada de instrução. Muita dança e pouca Bíblia. Usam como argumento que Davi dançava. Davi fazia outras coisas também, mas que têm seu lugar e contexto apropriado para serem feitas na presença de Deus. Culto requer reverência e quietude. Deve ser feito nos termos estabelecidos pelo próprio Deus. Deus revela na Sua Palavra como quer ser adorado. A igreja não é livre para escolher como quer cultuar. Essa deve sujeitar-se às Escrituras Sagradas. E não devemos nos esquecer do senso comum. Há coisas que devemos fazer porque são racionais. No calor insuportável do Rio de Janeiro, pessoas têm sido levadas à exaustão ao participarem de cultos intermináveis, que não preparam a mente para o ponto mais elevado da liturgia cristã, que é a pregação da Palavra acompanhada da resposta obediente do povo eleito de Deus em oração.

Concluindo, penso que é importante enfatizar a todos os seguintes desafios da hora presente:

O desafio de lutarmos pela unidade da igreja, não permitindo que doutrinas secundárias nos dividam. Há uma hierarquia de verdades nas Sagradas Escrituras. Todas as doutrinas bíblicas são importantes, mas nem todas têm igual valor. Não podemos nos separar por causa de diferenças secundárias.

O desafio de amorosamente mostrarmos, à luz das Escrituras, o erro doutrinário que não mata, porém enfraquece a igreja. Certas práticas não condenam completamente certas igrejas, a ponto de, por motivo de consciência, termos que rejeitar a comunhão com elas. São comportamentos e noções, contudo, empobrecedores da experiência cristã. É neste ponto que muita gente pode ficar magoada, porém não podemos nos calar. Muito embora admita uma escala de valor doutrinário, não penso que devemos nos calar quando o menor erro teológico é ensinado pela igreja.

O desafio de lutarmos pela divisão da igreja. Sei que antes de falarmos em divisão temos que falar em unidade. O que fazer, entretanto, com os grupos que já foram admoestados, não se comunicam com nenhum outro setor da igreja evangélica do país e continuam a ensinar o erro que é letal para a vida dos seres humanos, fazendo tropeçar milhares de brasileiros que pensam que igreja que não é católica no Brasil é evangélica? Há uma diferença grande entre cisão e divisão. A cisão é sempre pecaminosa, pois representa verdadeiros crentes se dividindo sem motivo doutrinário ou ético que justifique a quebra da comunhão. Já a divisão nem sempre representa o esquartejamento do corpo, mas a decisão de se retirar uma célula cancerígena.

Uma igreja que louva a Deus pela reforma protestante e que ao mesmo tempo tolera no seu seio os erros doutrinários e pecados que os reformadores condenaram é no mínimo inconsistente, para não dizer covarde. Vamos deixar tudo nas mãos de Deus? Lutero deixou tudo irresponsavelmente a cargo da vontade de Deus? Se ele tivesse pensado assim, hoje não gozaríamos da liberdade em Cristo de que gozamos. Sabemos que a igreja jamais muda sem a intervenção divina e que nossos melhores esforços redundam em nada quando desprovidos da graça, sem a qual a igreja murcha. Quem pode, com base nessa verdade, no entanto, condenar o zelo que leva os verdadeiros crentes a lutarem com a ajuda dos céus pela pureza da igreja?

Que o Deus de amor nos ajude a, em nome do amor, mantermos a paz entre seus verdadeiros filhos, ainda que tenhamos que conviver com o que não nos agrada uns nos outros. O fato é que se temos muito o que tolerar nos outros, os outros têm muitos o que tolerar em nós. Por isso a regra da casa é a longanimidade. Rogo, no entanto, que o Deus da verdade nos ajude a lutarmos pelas verdades que custaram a vida de muitos irmãos reformadores no passado. Mesmo que esta luta implique perda de comunhão com pessoas que no minuto seguinte a nossa decisão de ficar ao lado da verdade haverão de nos perseguir e odiar.

Antonio Carlos Costa

SERÁ QUE AS COISAS PODEM MUDAR?


Observa-se nas rodas de conversa nas cidades brasileiras que o povo não acredita mais em mudança. Dizem que os políticos não prestam, e que o próprio povo não vale nada. Há até uma piada famosa no Brasil inteiro que é bastante sintomática da patologia que enfrentamos. A piada que exalta as belezas naturais do Brasil, mas ao mesmo tempo destaca que o povo é quem estraga tudo. Mudar esse paradigma não é fácil. E não apenas pelas desventuras que nossa nação enfrenta. Pense na história da humanidade. Não há nada mais desalentador, por exemplo do que estudar história geral. É um banho de sangue do início ao fim. Nunca estudei sobre um povo que não tenha crescido através de guerra, que não tenha escravizado seu semelhante e não tenha oprimido à mulher. Como você vê, o problema não está só com o Brasil. O homem é um ser cindido. Nele há luz e sombra. Cordeiro e bode. Um bom realismo é saudável. Contudo, precisamos de nos lembrar também que existem nações que conseguiram encontrar uma forma civilizada de convivência. Se elas puderam nós podemos também. A pergunta que precisamos responder é a seguinte: como foi que elas chegaram lá? Que adaptações podemos fazer das suas experiências? Por exemplo, constata-se que pior do que o desperdício de recursos naturais é o desperdício de neurônios. Onde pode-se encontrar o registro de uma nação que cresceu sem educação? O que o movimento democracia viva se propõe a fazer é trazer à memória do povo brasileiro que vivemos num país rico. Temos recursos suficientes para vivermos com dignidade. Vivemos num país em que existem pessoas de talento com boas idéias. Tenho conhecido muitas delas. O que precisamos é permitir que suas idéias venham à tona, sejam discutidas e implementadas. Nossa nação tem uma boa constituição federal e é a maior força democrática da América Latina. O que necessitamos fazer é mostrar para o povo brasileiro os canais de expressão democrática da vontade popular.

A FALTA DE PARTICIPAÇÃO DO POVO BRASILEIRO


O que está errado no Brasil é o brasileiro. Milhares de brasileiros já não se importam mais. E até mesmo os que são incapazes de cometer de modo direto o mal, mantém-se num silêncio criminoso. A cultura da banalização da vida humana já é traço da vida nacional. Ora, os políticos sobre os quais estamos falando são cidadãos dessa pátria que não protesta quando massacres tais como, Carandiru, Candelária, Queimados, Vigário Geral, entre outros, ocorrem. Como sabemos que uma fração significativa da população não se importa com o ser humano (há brasileiros honestos), e muitos destes têm chegado ao poder, é mister que o crime seja dissuadido mediante leis firmes e de execução garantida. Qual deve ser a pena a ser sofrida por um homem que ludibriou os que nele votaram, desviou dinheiro público com plena consciência dos seus atos e consequentemente foi agente indireto da morte de milhares de brasileiros? E tão importante quanto as mudanças no campo legal, é a criação de uma cultura de participação democrática através da formação de uma consciência cidadã. O brasileiro precisa saber o que é viver num estado democrático. Carece de conhecer quais os seus direitos e quais os seus deveres. Enquanto tivermos milhares servindo de massa de manobra nas mãos de políticos inescrupulosos não há esperança de nossos melhores quadros chegarem ao poder.

A RESPOSTA ESTÁ NA RELIGIÃO?



Tudo dependerá de que tipo de religião estamos falando. Se estamos falando de uma religião que oprime a mulher, afirma que estamos nessa vida pagando pelos pecados de uma vida passada, ensina que existem "karmas" dos quais não podemos nos livrar, proclama solução para os problemas do ser humano na base de passe de mágica, prega a manutenção do status quo, é óbvio que essa religião haverá de ser o ópio do povo. Confesso que de religião estou cansado. Porém, se você está falando de algo que faz o homem acreditar que existe um Deus santo e justo que haverá um dia de exigir que os homens prestem contas das suas ações, que ensina que este Deus justo é ao mesmo tempo um Deus de amor que tem interesse na libertação integral do ser humano, que proclama o valor incalculável tanto do homem como da mulher, que admoesta a todos a enquanto orarem arregaçarem as mangas da camisa para lutarem por um mundo melhor e provê meios para que o homem se livre dessa sua natureza de bode, não tenho a mínima dúvida de que mudanças em todas as esferas da vida poderão ocorrer no Brasil e em qualquer lugar do mundo.


No âmago dos nossos problemas está o egoísmo que nos consome. Tão fácil de ser detectado na vida dos outros, e difícil de ser descoberto na nossa. Associado a esse autocentrismo encontramos todas as mudanças que houve nos últimos anos no cenário filosófico do mundo ocidental. É curioso observar que algumas das pessoas que mostram-se indignadas com o que acontece em Brasília, continuam a ensinar que tudo é relativo. Não existem padrões morais absolutos. Vivemos uma crise de valores sem paralelo na história da humanidade. Pela primeira vez Deus encontra-se no banco dos réus. Acusado por um ser que afirma que tudo é relativo, que o homem não é responsável pelas suas ações, pois aquilo que faz é regido pelo seu inconsciente, pela química do seu cérebro ou pelo meio em que vive, mas que ao mesmo tempo diz: "Os dirigentes do PT não valem nada". Em que ponto quero chegar? A verdadeira religião haveria de dar base para a construção de valores sem os quais a vida em sociedade torna-se impossível. E essa só encontro em Jesus.

A MINHA ESPERANÇA PROTESTANTE


A presença de cristãos protestantes no nosso país me enche de esperança. Tenho motivos de sobra para isso. O verdadeiro protestante é um homem da Bíblia. E o contato com esse livro faz o ser humano sonhar e ansiar por se livrar de qualquer espécie de algema que o prenda. O cristianismo remete quem compreendeu e abraçou sua mensagem para a luta em favor da justiça.
Nesse sentido, o movimento protestante é a vertente da fé cristã que melhor soube encarnar a essência do evangelho. A história mostra que por onde o protestantismo passou (especialmente o calvinista), com raríssimas exceções, houve avanços em todas às áreas da vida. Na área da educação os protestantes erradicaram o analfabetismo, fundaram colégios e universidades. As universidades de Yale, Harvard, Princeton foram fundadas por protestantes calvinistas. Na política os encontramos entre os maiores defensores de governos, democráticos, constitucionais e republicanos. Mesmo um homem como Rousseau foi levado a reconhecer este fato ao falar sobre a vida do maior teólogo protestante, João Calvino: "Enquanto o amor à pátria e à liberdade não for extinto entre nós, jamais a memória deste grande homem cessará de ser uma bênção". Basta olhar para a história da Holanda, Inglaterra e Estados Unidos para comprovarmos o fato indiscutível de que essa fé tem produzido liberdade e defesa dos direitos humanos. No campo das artes embelezaram a vida com as composições de Bach e os quadros de Rembrandt. No campo da ciência fundaram a Royal Society de Londres e dominaram a Academie des Scienses parisiense durante o período de 1666 a 1883. Sucessivas pesquisas mostram que tanto as ciências físicas quanto as biológicas eram dominadas por calvinistas durante os séculos 16 e 17.
Não me envergonho de dizer que parte da minha esperança quanto ao futuro do Brasil, reside nesse crescimento de igrejas protestantes em todas as nossas cidades. Se o protestantismo histórico brasileiro for mais fiel às suas origens, os milhares de pentecostais conhecerem o que houve no século 16 mediante o trabalho de Martinho Lutero e João Calvino, com a graça de Deus a probabilidade é grande de espantosas mudanças sociais ocorrerem no Brasil.

DEMOCRACIA MORTA


Há democracia viva e há democracia morta. Qualquer nação que esteja vivendo uma experiência democrática sem respeito à santidade da vida humana vive o que chamamos de democracia morta. Esse, sem sombra de dúvida é o caso do Brasil. No nosso país o menosprezo ao ser humano virou cultura. Nesse sentido, trata-se de um problema relacionado não apenas ao governo, mas ao conjunto da população. O maior indício dessa cultura da banalização da vida humana no Brasil é a inércia da nossa sociedade, capaz de conviver pacificamente com tamanhas violações dos direitos humanos na nossa terra. O "mensalão" está obviamente inserido nesse contexto de desconsideração ao valor incalculável do ser humano. Indicação segura de que vivemos numa democracia morta. Por que motivo? Entre outras coisas, pela maneira imoral de se votar. Pense na hediondez de um parlamentar apoiar numa sessão da câmara dos deputados não o que é melhor para nação e sim para o seu bolso. E isso num ambiente de impunidade, no qual o que pratica o mal sabe que no Brasil o crime compensa. Porém, infelizmente isso não é o que há de pior na nossa nação. Há evidências tão ou mais dramáticas dessa desvalorização da vida. Os presídios superlotados, a disparidade social, a imundície das nossas cidades, a violência urbana, o descumprimento constante da constituição federal, entre tantos outros impressionantes absurdos. Às vezes fico a pensar se tudo o que meus olhos vêem é verdadeiro. A vida por si só é luta do princípio ao fim, e nós a estamos tornando inviável no Brasil.

O TRABALHO DE UM BOM DEPUTADO EVANGÉLICO


O que é necessário para que um deputado que se diz evangélico realize um bom trabalho?? Em primeiro lugar, haver chegado ao poder de modo legítimo, podendo assim ter autoridade moral para falar. Mas, se esse político chegou a Brasília com base em verba fraudulenta de campanha (quem sabe, entre outras coisas, usando dízimo do povo de Deus), firmado em votos conquistados em cultos que, em vez de terem a finalidade de cultuar ao Deus Trino, se transformaram num comício, sustentado através de apoio obtido mediante ajuda de pastores que transformaram a igreja em curral eleitoral, que têm fé para dizer para a irmã que Jesus vai curar o seu câncer, mas não têm fé para, sem ajuda de político, construir o seu templo, ou comprar sua estação de rádio; sinceramente, não vejo como esse homem poderá exercer sua função parlamentar com respeito por parte dos demais parlamentares.
Em segundo lugar, não basta esse homem ser evangélico. Ele foi preparado para a vida pública? Ele tem experiência política? Ele tem boa formação cultural? Ele é crente? Demonstra isso mediante um casamento sólido e bom testemunho perante os irmãos da igreja?
Em terceiro lugar, este político evangélico conhece as demandas sociais do evangelho? Por quê ele está lutando? Pelo dia da Bíblia? Pelo feriado em homenagem a Lutero? Ou em vez de se preocupar com aquilo que não preocupa a Deus e sem o qual o homem pode viver, esse parlamentar está em busca de condições de vida dignas para o povo brasileiro nas áreas da saúde, educação, trabalho, moradia e segurança?
Diante do que foi acima exposto, a pergunta a que precisamos responder é a seguinte: nossos parlamentares estão glorificando a Deus em Brasília? Creio firmemente que não. Se há algum fazendo um bom trabalho (devo admitir que há deputados evangélicos honestos e competentes), por favor revele ao país um projeto de lei importante para a vida da nação que saiu da sua pena, ou alguma participação sua que foi decisiva para tirar algum brasileiro da indigência.

A PERDA DO PRINCÍPIO PROTESTANTE


O protestantismo brasileiro não tem produzido os resultados históricos que produziu nas nações por onde passou, especialmente quando pensamos a partir da extensão numérica que alcançou em nosso país. É uma versão tão diluída da verdadeira fé dos reformadores, que hoje é incapaz de salvar o brasileiro do Brasil.
Contudo, temos que ter coragem de dizer que muito do que está sendo feito em nossa nação em nome dos evangélicos resulta da ação inescrupulosa de homens que pertencem a igrejas que não são protestantes. Não devemos julgar que, pelo fato de uma igreja não ser católica e ostentar o nome de evangélica, a mesma seja protestante. Há igrejas no Brasil que não são católicas, não são protestantes e muito menos cristãs. São uma outra coisa.
E enquanto nós, protestantes, movidos por um equivocado medo de entristecermos o Espírito Santo, ou pior, por covardia e receio de perder privilégios, não fizermos esta separação, permitiremos que milhares de brasileiros tropecem, julgando que somos todos iguais.
Não venha me dizer que um povo capaz de afirmar que Lutero agiu bem ao propor uma reforma na igreja é coerente quando deixa de denunciar erros que levaram o grande reformador alemão a protestar. Se Martinho Lutero visse o que está ocorrendo nos dias de hoje em igrejas que se dizem evangélicas, vomitaria. Somos protestantes. É da essência do protestantismo lutar por uma igreja pura. Não podemos, em nome do amor, manter uma unidade promíscua que afasta o Espírito Santo de nossas assembléias.

OS CASOS DE CORRUPÇÃO ENVOLVENDO O PARTIDO DOS TRABALHADORES


Penso que nós, protestantes, que conhecemos tudo aquilo que a Bíblia fala sobre submissão e respeito às autoridades constituídas por Deus, deveríamos nos reportar ao nosso presidente de uma forma sempre respeitosa. No calor do debate, com a imagem do presidente da república seriamente afetada por todos esses escândalos que envolvem pessoas muito próximas a ele, soa a oportunismo profético falarmos de forma desrespeitosa de alguém a quem devemos respeito.
Porém, não há nenhum pressuposto ético na fé cristã que nos impeça de exigir que as denúncias de corrupção que envolvem seu governo sejam apuradas. E caso se torne claro que tudo aconteceu com a sua anuência, não tenho dúvida de que, devido à gravidade dos fatos, ele deva voluntariamente largar o governo, ou sofrer processo de impeachment.
Creio que o nível de frustração quanto à ética na política no nosso país pode, de certa forma, ser proporcional ao nível de expectativa criada quanto ao governo do PT. Confesso que as minhas expectativas não eram grandes. A inexperiência administrativa, associada ao despreparo e pressupostos ideológicos que ainda regem a ação política de integrantes desse partido, levou muitos de nós brasileiros a terem pouca esperança quanto ao seu destino.
Quanto à descrença política que tudo isso produz, julgo que qualquer pessoa que tenha um mínimo conhecimento sobre o tema sabe que a tendência de quem assume o poder é de se deixar corromper por ele (isso não é privilégio do Partido dos Trabalhadores). De certa forma, é bom não ter esperanças quanto à possibilidade do mundo da política ser diferente. Lembrando o cineasta americano Woody Allen, que, num dos seus filmes, fez um personagem dizer: "Eu não me admiro das guerras acontecerem, o que me causa admiração, e sendo o homem quem ele é, é não termos mais guerras ainda", eu diria que não me admiro das coisas na política serem assim. Sendo o homem quem ele é, eu me admiro das coisas não serem piores. Um pouco de realismo político pode nos ajudar a tomar medidas que debelem o mal assim que ele se manifestar, ou até mesmo o desestimule.
O que precisamos é matar de vez todo romantismo político e lutarmos por leis que determinem penas proporcionais à gravidade do delito praticado por pessoas que não souberam usar a confiança depositada pelo povo em suas vidas a fim de se utilizarem desse poder delegado para o benefício da população. Qual deve ser a pena aplicada a uma pessoa instruída, possuidora de plena percepção das conseqüências dos seus atos e que traiu a confiança da nação? Se nossas penas fossem mais severas para este tipo de crime e a execução das mesmas garantida, não viveríamos nesse estado de coisas. O Brasil é o país da impunidade. Aqui, o crime compensa.

A CORRUPÇÃO DO GOVERNO BRASILEIRO


Há três aspectos profundamente positivos nas denúncias que o governo brasileiro tem recebido. O primeiro, a evidência cabal de que estamos vivendo numa verdadeira democracia, na qual os erros dos governantes são apurados e a imprensa tem liberdade de trabalhar. O segundo, a lição histórica de que ao povo cabe manter-se atento quanto às ações dos que detêm o poder, pois há uma tendência quase inexorável de os que o alcançam se deixarem corromper pelo mesmo, deixando assim de zelar pela ordem, segurança, bem-estar e progresso da nação. Não há democracia saudável sem participação popular. Em terceiro e último lugar, eu destacaria como fator positivo a perda de uma esperança desmedida num partido político. Num mundo caído como o nosso, precisamos aprender a ser mais realistas quanto ao nível de expectativa que podemos ter a respeito das realizações humanas. Foi o Senhor Jesus quem nos ensinou a nos acautelarmos dos homens.
Como aspecto negativo dessas denúncias de corrupção, vejo o fato do Brasil, de 53 milhões de pessoas vivendo com 120 reais por mês e 21 milhões de seres humanos na linha da indigência, ganhando parcos 60 reais por mês, estar parado, com sua estabilidade econômica ameaçada e presenciando o lamentável espetáculo da CPMI, na qual observamos o nível de despreparo de muitos dos nossos parlamentares e o índice gravíssimo de corrupção dos poderes da república.
O meu sentimento em parte é de pesar. Fecho os olhos e penso nos nossos presídios superlotados, em pais de família chegando a casa sem pão, em jovens sendo cooptados pelo tráfico, em vidas sendo ceifadas pela violência urbana, nos bilhões de reais escoando pelo ralo da corrupção e percebo os que poderiam debelar esses males sendo usados pelas trevas para agravarem o caos social em que nos encontramos.
Contudo, pelos motivos supramencionados e tantos outros, tenho esperança. Não a esperança de viver num Éden chamado Brasil (minha teologia não me permite esperar tanto), mas de viver numa nação que deixe de ser a segunda do mundo com a pior distribuição de renda (perdendo apenas para Serra Leoa), na qual a corrupção cesse de ameaçar a democracia e o governo deixe de banalizar a vida humana.

DEMOCRACIA VIVA


Nos anos subseqüentes à reforma protestante no século XVI percebeu-se que muitos, apesar de terem voltado para a verdadeira doutrina que os reformadores haviam resgatado, não voltaram para a verdadeira vida cristã.

Pregadores, portanto, se viram diante da necessidade de pregar não mais apenas sobre reforma, mas sobre avivamento também. A reforma consistindo em um retorno à verdadeira doutrina e o avivamento significando uma volta à verdadeira vida cristã. O ramo protestante do cristianismo, a partir de então, passou a ficar preocupado com o que veio a se chamar “ortodoxia morta”. O que seria isso? O conhecimento doutrinário sem a devida transformação de vida. Pessoas de posse da verdadeira doutrina em suas mentes sem, contudo, experimentar do seu poder em seu coração.

Existem nações em que há o que se poderia chamar de democracia morta. Um país cuja experiência democrática seja dessa natureza experimenta uma liberdade política que não vem acompanhada de uma ampla promoção e preservação dos direitos humanos. Trata-se de um povo que é livre, porém privado de tantos outros direitos que, tal como a liberdade, se constituem em direitos inalienáveis do ser humano. Isto é grave pelos seguintes motivos: primeiro, a própria democracia torna-se seriamente ameaçada, pois mais importante do que ser livre é viver. Um povo cuja liberdade democrática não lhe garante a preservação da própria vida sempre haverá de estar seriamente vulnerável a qualquer forma de supressão da sua própria liberdade desde que esta lhe garanta o direito à existência. Isto é lamentável, pois a democracia é a forma de governo que melhor se ajusta à duas doutrinas inegociáveis da fé cristã: a doutrina da criação e a doutrina da queda. Porque o homem foi criado à imagem e semelhança de Deus é possuidor de uma dignidade intrínseca em razão da qual jamais deve ser governado sem seu consentimento. Mas, pelo fato do homem ser um ser caído não pode ser dotado de uma elevada carga de autoridade e de um poder inquestionável, pois é possível que se utilize desse mesmo poder indevido para a prática do que é perverso. A história tem provado que até agora a humanidade não encontrou nada melhor do que a democracia.

Em segundo lugar, a experiência de uma democracia sem respeito amplo à dignidade do ser humano é grave por falhar naquilo que lhe é mais essencial: a reverência à santidade da vida humana. O homem em razão da sua origem singular, conforme já foi mencionado, é possuidor de um valor incalculável em razão do qual jamais deve ter sua vida explorada, impedida de se desenvolver ou ceifada de modo impiedoso.

O Brasil precisa resgatar o conceito de democracia viva. Isto porque, após anos de conquistas democráticas, vê seu povo privado de seus direitos como cidadão e ser humano. A vida humana tem sido banalizada no nosso país. Falta justiça em nossa terra, pois nem todos estão recebendo aquilo que lhes é devido. Uns por serem privados dos seus direitos, outros por não serem julgados e condenados pela lei. Não vale a pena nesse ponto entrar em detalhes. Qualquer apresentação de uma lista de violação de direitos humanos no Brasil e crimes que não são punidos com justiça exige a redação de algo por demais extenso e que não cabe num documento como esse que se propõe a falar em linhas gerais.

A conseqüência dessa triste e espantosa constatação é a dúvida crescente no coração de muitos brasileiros quanto ao valor da democracia, um menosprezo à pátria, uma incipiente anarquia e a perda do valor da vida humana. Senão vejamos: percebe-se que muitos brasileiros estão expressando uma saudade da ditadura. É freqüente ouvir gente dizer que “no período da ditadura não era assim”. A situação criada está levando o país a esse tipo de pensamento. Um cenário perfeito para um ditador aparecer propondo “botar ordem na casa”. Collin Powell, ex-secretário de defesa norte-americano, disse recentemente que a democracia está seriamente ameaçada na América Latina devido aos altos índices de corrupção de suas instituições. Basta olharmos ao nosso redor para percebermos esse fato.

Vemos, de igual modo, milhares de brasileiros sem um mínimo amor à pátria. Sente-se que o Brasil como nação oferece pouco aos seus cidadãos. O governo é visto como contra o brasileiro na medida em que é eficaz na captação de impostos e ineficaz na distribuição de benefícios.

Em muitas das grandes cidades brasileiras há sinais claros de que a sociedade está se organizando para fazer justiça com as próprias mãos. Bairros inteiros estão se articulando para que seus moradores sejam protegidos por justiceiros que matam a revelia do estado democrático e constitucional. A probabilidade de isso se tornar praxe e desembocar numa guerra civil não deve ser menosprezada. Até quando a sociedade suportará viver em cidades onde homens sem a autorização dos poderes governamentais constituídos sentenciam e matam sem a mínima possibilidade do suposto malfeitor se defender ou ser ressocializado?

Porém, o mais dramático é perceber que o ser humano não tem mais valor no Brasil. Isto se evidencia das mais diversas formas. Desde o descaso dos nossos governantes até a indiferença de uma sociedade que já se acostumou com o menosprezo à vida. A banalização do ser humano no Brasil virou cultura. Os presídios estão superlotados com milhares vivendo em celas pútridas e prontos para, no retorno à sociedade, praticarem com nível maior de ódio os mesmo crimes que os levaram à prisão. A riqueza com a qual poderíamos oferecer condições dignas para nossos compatriotas escoa pelo já conhecido canal da corrupção. Milhares de pais de família estão privados de acesso ao trabalho, sendo assim, duramente atingidos na sua auto-estima por se sentirem inúteis e dependentes de uma filantropia que poderia ser desnecessária. Mães encontram-se com seus cabelos embranquecidos antes do tempo por terem enterrado filhos que foram assassinados ou que se tornaram inválidos por bala perdida. Vivemos num país onde o crime compensa. Criminosos que matam impiedosamente, empresários que corrompem sem remorso e políticos que saqueiam o bem público sem o mínimo senso de vergonha sabem que não serão punidos. São recursos e mais recursos legais que seus hábeis advogados usam até o crime prescrever.

Por tudo isso é que precisamos sonhar com uma democracia que nos traga além de liberdade, justiça. Uma democracia viva. Mas, por onde começar? Antropólogos, sociólogos, analistas políticos entre outros vêem a tarefa como um mega desafio cujos frutos só serão colhidos daqui a centenas de anos. Há uma ampla frente de desafios sociais que tira o fôlego de qualquer pessoa sensível e atenta aos fatos.

Porém, há cinco fatores que nos devem conduzir à esperança: primeiro, o país é extraordinariamente grande e rico. Não será por falta de recursos, sejam de que natureza forem, que ficaremos privados de viver uma vida digna. Tudo o que precisamos é fazer esta riqueza ser melhor distribuída. Segundo, sabemos da presença em nosso país de brasileiros bem preparados, decentes e que podem ajudar a descobrirmos que políticas são hoje indispensáveis para que haja justiça na nossa terra. Tudo o que precisamos fazer é exigir que aquilo que muitos sabem que deve e pode ser feito se concretize imediatamente a fim de que saiamos deste quadro aterrador. Terceiro, há milhares de brasileiros indignados e ansiosos por verem o país passar por profundas transformações sociais, especialmente no campo dos direitos humanos. Tudo o que precisamos fazer é ajudar este contingente enorme a se expressar e fazer prevalecer o anseio por justiça. Quarto, temos uma excelente constituição federal que garante a defesa de todos os direitos inalienáveis do homem, entre estes o direito à livre expressão e ao protesto. Tudo o que precisamos fazer é tornar conhecidos do povo brasileiro os canais constitucionais de expressão democrática a fim de que a sociedade exerça sua cidadania lutando pelo cumprimento da lei. Quinto, pela graça de Deus, nos últimos anos, surgiu nesse país uma multidão de homens e mulheres que conheceram o evangelho libertador do Senhor Jesus Cristo. Este povo é o segmento da sociedade brasileira mais fácil de ser mobilizado para uma efetiva campanha de participação popular na transformação social do Brasil. Esta gente se reúne pelo menos todos os domingos, tem o evangelho que aviva sua consciência e sofre as conseqüências de viver num país como o Brasil. Tudo o que precisamos fazer é chamar este povo para pela primeira vez em sua história participar de modo concreto na cura de anos e anos de injustiça e miséria de nossa pátria.

Se a igreja se organizar para essa luta chamando tantos outros brasileiros para uma participação mais ativa na vida nacional, não há dúvida que grande parte da sociedade brasileira haverá de se organizar também. Isso dará ensejo ao que de mais necessário existe para que tenhamos uma democracia viva. A participação popular. A possibilidade é mínima de uma universal defesa dos direitos humanos e o cumprimento da nossa constituição federal ocorrerem de outra forma. O nível de comprometimento de nossas instituições com o crime e a corrupção é tal que somente uma forte pressão popular para uma mudança eficaz na realidade social vigente. Não há nada que nossos governantes mais temam do que perder o eleitorado. A história recente do nosso país mostra o que pode ocorrer quando o povo participa de modo ordeiro, consciente, lúcido e democrático. Qual foi o efeito da “Campanha das diretas já?” Não vivemos hoje numa democracia que em parte se deve ao que ocorreu alguns anos atrás mediante manifestação pública? Como foi que um presidente nosso sofreu processo de impeachment?

Porém, precisamos vencer os obstáculos que têm mantido a igreja inerte e impedida de cruzar esse mar vermelho de maldade e garantir para seus filhos e o povo brasileiro uma libertação nunca antes experimentada em nossa nação. Que obstáculos são esses?

1. O ceticismo que grassa em nosso país e que entrou no coração de muitos de nós crentes que nos leva a não ver possibilidade alguma do Brasil mudar.

O quadro é dramático, todos nós sabemos. Porém, que direito tem de duvidar um povo que serve a um Deus que do nada criou os céus e a terra e que no tempo e no espaço ressuscitou seu Único Filho? Como pode descrer que esse tipo de coisa é possível um povo que sabe que pode ser sal da terra e luz do mundo? É evidente que ambas as metáforas usadas por Cristo no levam a crer que este não é apenas o chamado da igreja, mas que as coisas podem mudar. As trevas podem ser dissipadas, a vida pode ganhar sabor. E como resultado de tudo isso um mundo de gente viver melhor e o nome do nosso Pai ser glorificado.

2. O excessivo pessimismo antropológico faz com que a igreja permaneça mais cética ainda quanto à possibilidade de transformações históricas ocorrerem no Brasil.

Muitos julgam que a doutrina do pecado impede a igreja de ter esperança quanto à vida do homem sem Cristo. E de fato o homem que não nasceu de novo é um escravo do pecado e precisa de um salvador que o salve da culpa do pecado e da escravidão do pecado. Porém, encontramos na Bíblia duas doutrinas que devem ser postas lado a lado com a doutrina do pecado. As doutrinas da graça comum e da imagem e semelhança de Deus que o homem carrega. Há uma graça que Deus derrama sobre a vida como um todo que embora não salve, preserva, enriquece e embeleza a vida. Sabemos de não cristãos que têm valores cristãos em seu coração. Não que sejam cristãos, pois cristão é somente aquele que fez uma opção racional de ser conscientemente discípulo de Cristo. Ninguém é cristão inconscientemente. Porém, por causa da graça comum, os seres humanos podem almejar o que é justo e bom. Quanto a igreja já herdou de homens e mulheres que não professavam fé em Cristo? Não é fato que o povo de Israel saiu do Egito com o ouro dos egípcios? Em conexão com isso, não podemos nos esquecer do que resta da imagem e semelhança de Deus mesmo no homem caído. O ser humano, tal como o é hoje, continua tendo características do próprio Deus em sua vida. Por isso que muitas vezes cristãos vêem não cristãos amando algumas das coisas que todo e qualquer servo de Deus ama. Ambos os artigos de fé, a doutrina da graça comum e da imagem de Deus que todo homem carrega, deveriam encher-nos da esperança do mundo apreciar alguns dos valores cristãos que amamos, que nos são absolutos e que são auto-evidentes.

3. O excessivo pessimismo histórico-escatológico tem levado tantos outros a não nutrirem esperança alguma quanto a este mundo.

E de fato não se pode negar que o reino de paz, justiça e verdade é um dom de Deus. Não uma conquista humana. Uma crise repentina que irrompe e subitamente transforma o mundo, o homem e o cosmos. Não uma transformação progressiva que traz o paraíso para a terra mediante a ação política do homem. Porém, temos diante de nós o mandato cultural. O chamado solene feito por Deus aos nossos pais e consequentemente a nós de crescer e dominar a terra. O presente mundo jaz no maligno, mas isso é ensinado pelas Escrituras não para a igreja se conformar com ele e sim para transformá-lo. Obviamente sem romantismos, enquanto aguarda a irrupção do Reino de Cristo. Os que vivem de outro modo pecam por não viverem responsavelmente. Enquanto isso, colhem os frutos de seus antepassados que, por terem visto a vida de outra maneira, consagraram sua existência às causas do Reino dos Céus e deixaram para as gerações subseqüentes um mundo que embora não tenha se transformado em um Éden se tornou muito melhor do que seria caso servos de Deus fiéis tivessem cruzados os braços e irresponsavelmente aguardado o fim do mundo. Graças a Deus por um William Wilberforce, irmão nosso na fé, que na Inglaterra não deu descanso a si mesmo enquanto não terminou com a escravidão. Graças a Deus por centenas e milhares de irmãos nossos que em tempos passados lutaram pela democracia (basta estudar a história da Inglaterra, Estados Unidos e Holanda por exemplo), promoveram a educação (as universidades de Harvard e Princeton foram fundadas por crentes), produziram obras de arte (como Rembrandt, protestante holandês e Bach, compositor protestante alemão). Louvado seja o nosso Deus por Abraham Kuyper, protestante calvinista holandês que de 1901 a 1905 foi primeiro ministro da Holanda, criador da Universidade Livre de Amsterdã que em certa ocasião foi levado a dizer: "Não há uma área da vida para a qual Cristo olhe e não diga, 'Isso é meu'". A história prova que cristãos no passado deixaram rastro de vida e salvação por onde passaram, vindo assim a transformar suas nações. O protestantismo brasileiro tem negado sua herança histórica.

4. A reação ao liberalismo teológico e a teologia da libertação, com suas ênfases na ação social por parte da igreja, levaram muitos de nós para o extremo oposto da falta de compromisso com a luta pela mudança das estruturas malignas que infelicitam o homem.

Não resta dúvida que reduzir a missão da igreja à simples ação política é desconsiderar a maior necessidade do homem que é a de transcendência. Significa ser romântico quanto ao que pode nos conduzir a um mundo justo, pois só o evangelho trata da raiz de todos os males que é o pecado que habita no coração de uma raça que é capaz de matar em tempos de paz. E o pior, é fazer pouco caso do sacrifício de nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo, cujo evangelho chama todos os homens a saberem que "Deus amou o mundo de tal maneira que deu seu Filho unigênito para que todo aquele que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna". Contudo, o Deus que nos chama para o cumprimento da grande comissão nos chama também para o cumprimento do grande mandamento. Ao lado do chamado para pregar o evangelho encontramos na Bíblia o chamado para amar de forma integral o próximo com a espécie de amor que temos por nós mesmos. E não é uma grande expressão de amor lutarmos contra o pecado sistêmico que é responsável pela desgraça de milhares? Até quando permaneceremos praticando apenas as sempre indispensáveis obras de filantropia quando poderíamos de uma só vez libertar milhares através de amplas obras de transformação das estruturas do mal?

5. O desconhecimento de um plano de ação eficaz, que não seja ingênuo e que leve o crente a ver um modo concreto de cooperar com o país é um outro obstáculo à ação.

Nosso problema não é apenas falta de amor. Sem hesitação todos podemos dizer que há uma geração de crentes desalmados que não se importa com seu semelhante. Mas, ao mesmo tempo, há pessoas que não agem por que seus pastores não lhes passam uma base teológica e intelectual para a ação. E de modo semelhante, há pessoas que, por terem nascido num país onde não há uma cultura democrática e de participação voluntária do cidadão, não sabem como agir. Por isso chegou a hora da igreja dar uma passo inicial para uma participação ativa na mudança da história de um país que pode um dia vir a ser luz para os povos.

No século VIII antes de Cristo, diz o livro do profeta Jonas que Deus levantou a este para se dirigir aos habitantes de Nínive nos seguintes termos: “Dispõe-te, vai à grande cidade de Nínive e clama contra ela, porque a sua malícia subiu até mim”. Tudo o que nós cristãos sabemos sobre Deus, nas Escrituras Sagradas, nos leva a crer que a malícia do Brasil subiu até o Criador Santo. A igreja tem que erguer sua voz sob pena de Deus ter que julgar sua igreja e a sociedade como um todo por conviver com tamanhas atrocidades de modo tão indiferente. Porém, o Deus cristão tem mais prazer na compaixão do que na destruição dos que violam sua lei. Por isso o livro do profeta Jonas termina com as palavras que deveriam afetar a todos nós que tememos e amamos a Deus: “...e não hei de eu ter compaixão da grande cidade de Nínive, em que há mais de cento e vinte mil pessoas, que não sabem discernir entre a mão direita e a mão esquerda, e também muitos animais?” Que Deus nos dê coragem para erguer a voz na nossa Nínive, o amado Brasil com seus 185 milhões de habitantes.

Antonio Carlos Costa

RIO DE PAZ


O Rio de Paz nasceu no início do ano de 2007 a partir do sonho de alguns pastores e membros de igrejas protestantes de organizar a sociedade civil para o combate à violência urbana no Rio de Janeiro.
Sendo assim, trata-se de um movimento que deve sua origem a um segmento da sociedade brasileira dos mais fáceis de ser mobilizado para a ação. Os cristãos protestantes brasileiros além de se reunirem regularmente para o estudo das Escrituras e o culto a Deus, o que facilita enormemente a comunicação, carregam no coração fatores predisponentes para o envolvimento com a luta pelo valor da vida, tais como amor pelos seres humanos, senso de justiça e zelo pela glória de Deus, produzidos pelo contato com o conteúdo do evangelho de Cristo.
Como o problema da violência urbana diz respeito à sociedade como um todo, a comunidade protestante tenciona chamar os demais cidadãos do Rio de Janeiro, independentemente da visão de mundo que tenham, mas que de igual modo se importam com o próximo, a se envolverem na luta pela preservação da vida.
Nunca a santidade da vida foi tão fortemente ultrajada como nestes dias em que um rio de sangue tem sido jorrado na nossa cidade. Milhares de pessoas assassinadas. Pais com os cabelos grisalhos antes do tempo por terem enterrado filhos amados. Homens e mulheres que tentam voltar a encontrar energia para viver após a perda de parentes e amigos, mortos por pessoas que fazem parte de uma geração que entrará para a história do Rio de Janeiro como uma das mais malvadas e desalmadas.
Teólogos e pregadores do passado costumavam falar dos seus púlpitos sobre os pecados de comissão e os pecados de omissão. O primeiro significando a prática ativa do mal, e, o segundo tendo o sentido da omissão na prática do bem. Parece que nossa sociedade apenas acredita nos pecados de comissão. Ela é capaz de chamar os crimes que se praticam de pecado. Ao mesmo tempo, contudo, não é capaz de perceber que aos olhos do Criador santo peca aquele que se recusa a praticar o bem. O silêncio dos cidadãos da nossa cidade é criminoso. Os cadáveres estão expostos a céu aberto e não sentimos nada. Pessoas descem à sepultura em meio a agonia da família e não nos sensibilizamos. Perdemos a alma.
O Rio de Paz tenciona avivar a consciência dos cidadãos do Rio de Janeiro e ajudar a sociedade a se organizar a fim de trazer de volta justiça e paz a nossa cidade. Inicialmente tencionamos fazer as seguintes coisas:

1. LUTO PELO RIO. Trata-se de protestos públicos na Cinelândia a fim de expressar solidariedade as famílias enlutadas e clamar por justiça e paz na nossa terra. As pessoas são chamadas a participar vestidas de camisa preta e com velas acesas na mão no propósito de exprimir tristeza de uma forma solene.

2. MARCO DA BARBÁRIE. No dia nove de fevereiro de 2007 criaremos um símbolo que todos possam ver e que traga a memória do povo que a violência na cidade do Rio de Janeiro está dentro da esfera do inaceitável e do absurdo. Este sinal só será retirado quando o nível da criminalidade após um ano baixar a números que sejam compatíveis aos encontrados em cidades civilizadas, neste mundo de trevas em que vivemos. Quando este dia chegar, não mais vestidos de preto, mas sim de branco, celebraremos numa grande festa a vitória da vida sobre morte.

3. ARAUTOS DA PAZ. Estes agentes da paz terão como objetivo fazer manifestações públicas inteligentes no minuto seguinte aos crimes ocorridos e que causaram grande comoção popular. O alvo é mostrar que a sociedade não está mais apenas a ler jornal.

4. VOZ DA CONSCIÊNCIA. Estamos certos de que este estado de coisas no Rio de Janeiro deve-se ao fato da consciência da população estar adormecida. Se os cidadãos desta cidade se levantassem a uma só voz não veríamos tantos cariocas mortos nas nossas ruas, praças, valas e esquinas. Por isto temos como alvo fazer um grande trabalho de avivamento de consciência através de mensagens escritas, pregações, outdoors, conferências entre tantos outros meios mais que esperamos usar.

Certamente muitos poderão se levantar chamando o que está sendo feito de romântico, inócuo ou amador. Bom, o que temos a dizer é que estamos arrependidos do nosso silêncio e omissão. E, agora emergimos de anos de indiferença a fim de fazermos alguma coisa. É isto que pensamos que podemos fazer. É isto que faremos com a ajuda dos céus.
Que o Deus Santo esteja conosco e um Rio de paz flua no lugar do Rio de sangue.
Pastor Antonio Carlos Costa
Presidente do Movimento Democracia Viva e Rio de Paz
Pastor da Igreja Presbiteriana da Barra