terça-feira, 25 de setembro de 2007

DOS DELITOS E DAS PENAS – BECCARIA (PARTE X)


Somente hoje pude retornar ao exame desta obra normativa sobre direito penal. Analisemos, portanto, mais algumas das declarações do grande jurista italiano, sobre um tema que, nós brasileiros, carecemos desesperadamente de conhecer melhor.

Na seção em que Beccaria trata dos delitos de difícil prova, há três declarações dignas do exame de todos nós: A primeira, tem relação com o fato de que o juiz não deve a priori ter como meta provar o delito, mas buscar a verdade. Nós brasileiros, tão fartos de impunidade, precisamos tomar cuidado para que, na ânsia de punirmos os culpados por tantos crimes graves que são cometidos livremente no nosso país, não caiamos no erro de querer moralizar as coisas mediante condenações precipitadas, nas quais a verdade não foi indiscutivelmente estabelecida.

A segunda declaração que me chama atenção é a seguinte: “Não se pode chamar precisamente justa (isto é, necessária) a pena de um delito, enquanto a lei, nas dadas circunstâncias de uma nação, não tenha aplicado os melhores meios possíveis para preveni-lo”. Poucas declarações ajustam-se de modo tão claro ao nosso momento. Percebe-se, especialmente na classe média brasileira, uma grande sede de vingança. Pessoas estão iradas pelos crimes bárbaros cometidos e que não foram punidos. O que nos esquecemos em muitas ocasiões, é que o contexto social em que vivemos expõe o brasileiro à prática do crime. Não quero com isto justificar a barbárie. Estupro acompanhado de morte, por exemplo, não pode encontrar sua justificativa na miséria. Contudo, vivemos em ambientes que fomentam os conflitos humanos. Outro dia pude ver isto no Maracanã. Centenas de pessoas se acotovelando para comprar ingresso. A hora do jogo se aproximando. E todos ansiosos por ver as filas imensas chegarem ao fim. Tudo desnecessário. Por que somente um guichê? Bom, num ambiente como este, é óbvio que conflitos ocorrem, como pude testemunhar naquele dia. Note que estou falando de fila para uma partida de futebol. Não estou falando sobre ratazana na cama de um favelado, esgoto à céu aberto, salário insuficiente, ausência de ordem estabelecida pelo Estado numa comunidade onde o poder público não se faz presente, etc.

Outra afirmação pertinente à nossa realidade: “Porque os homens só se arriscam na proporção da vantagem que lhes propicia o bom êxito de um empreendimento”. Há uma íntima relação entre crime e recompensa do crime. Esta contabilidade tem que se tornar, mediante as leis, profundamente desvantajosa para o criminoso. Esta é a questão: qual o limite que o Estado deve estabelecer para a extensão da punição prescrita pela lei, de uma tal maneira que, a dignidade humana do malfeitor seja respeitada e ao mesmo tempo a punição para o delito torne o crime um negócio arriscado demais, e, assim, inocentes não sofram?

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