quarta-feira, 2 de maio de 2007

O SILÊNCIO DOS BONS

A ONG Anistia Internacional está divulgando um relatório com duras críticas à política de segurança do Brasil. No documento constam denúncias gravíssimas que não são dignas de um país que queira fazer parte do Conselho de Segurança da ONU. Como o Brasil pode ter o respeito das demais nações se permite que os crimes apontados pelo relatório façam parte do cotidiano das suas cidades?
Os erros na área da segurança pública que mais chamam a atenção da Anistia Internacional têm relação com o despreparo da nossa polícia (mal treinada, sem recursos e com pouca capacidade para ações de inteligência), negligência dos estados com bairros pobres (zonas sem lei onde os moradores são atacados por bandidos e pela polícia), falta de política de segurança pública (focada na exclusão social como causa de violência), sistema penitenciário em colapso (com corrupção e dominado pelo crime organizado). Para Anistia o crime está enraizado, há vantagens corruptas no sistema judicial interessado em manter os problemas, promessas de campanhas para o campo da segurança pública não foram cumpridas, ligações de alto nível com o crime organizado dentro da polícia, entre tantos outros problemas.
Os números apresentados pela Anistia são assustadores. No ano de 2006 houve mais de 1.000 mortos em ações policiais no Rio de Janeiro. Entre 1998 e 2005, ocorreram 6.336 homicídios por ano no estado, ou 43, 5 mortes para cada 100 mil habitantes. Em dezembro de 2006 as milícias controlavam 92 das mais de 500 favelas do Rio.

Todos estes dados nos levam a algumas conclusões. Não há necessidade social maior no Brasil de hoje do que uma ação radical do poder público no campo da segurança pública. Milhares de famílias brasileiras estão de luto. Basta que multipliquemos cada morte pelo número de familiares das vítimas de homicídio para podermos dimensionar a extensão da dor. É a vida que se foi e a vida que ficou. A vida que foi interrompida e a vida que foi marcada para sempre. Em suma, os milhares que deixaram de viver e os milhares que não sabem o que fazer para encontrar sentido na vida. Até quando a democracia brasileira suportará tudo isso? O povo brasileiro tem expressado menosprezo pela sua pátria e dúvida quanto a viabilidade da democracia. A democracia, infelizmente, não é mais uma valor inegociável no coração de muitos cidadãos brasileiros. Isto precisa ser dito. Qual cidadão desse país que nunca ouviu alguém falar: “no tempo da ditadura militar não era assim”, “o Brasil só funciona com ditadura”?

O relatório da Anistia Internacional, apesar de excelente, não traz nada de novo para a sociedade brasileira. Não penso tanto nos pobres que, estão lutando pela vida, muitas vezes sem poderem falar por estarem acuados pelos criminosos, que não possuem dinheiro para comprar jornal e não têm acesso na maioria dos casos às informações. Penso na classe média brasileira, nos artistas, nos padres, nos pastores, nos empresários, nos estudantes, nos professores, entre tantos outros. Gente que não recebeu nenhuma informação nova através do documento da Anistia, mas que permanece desorganizada, inerte e muda perante toda esta tragédia que nos assoma. O pastor Martin Luther King descreveria muito bem o que deve nos supreender tanto quanto a prática indiscriminada do crime no Brasil: “Não me surpreendo com o grito dos maus, mas sim com o silêncio dos bons".

Antônio Carlos Costa
Rio de Paz

2 comentários:

  1. Rev. Antonio, sou membro da igreja plena de Icaraí, advogado e um (infelizmente) brasileiro tentando trabalhar e sobreviver neste feudo, perdão, país, que as vezes parace totalmente desgovernado. Tenho participado dos eventos do Rio de Paz, admiro sua disposição e oro a Deus que lhe dê forças e visão para continuar fazendo o que tem se proposto. Nossa nação, composta em sua maioria de analfabetos(isso inclui os universitários e a classe média, já que em geral só se procupam com futebol e big brother e só lêem revistas como "Caras"), se ressente da falta de líderes, e vejo em sua pessoa uma esperança de que possamos seguir alguém, a fim de mudarmos o atual estado de coisas. Louvo a Deus por um cristão ter se levantado, pois a igreja precisa sair do estado de letargia que vive, deixar a nauseante e estéril pregação da prosperidade e passar a lutar pela "vida real". Só uma coisa tenho a acrescentar: em um determinado momento o movimento social precisará avançar para atitudes radicais, de pressão absoluta ao poder público, porque só uma atuação política séria é que poderá mudar o rumo que esta nação tomou. O que ocorre é que os políticos e integrantes do judiciário em geral não entenderam ainda o sentido da palavra república, posto que agem ainda como proprietários de capitanias hereditárias, como senhores e não como servos. Não há vontade política, o governo petista só (não)pensa em evitar investigações, em fugir de escândalos e punições. Falou-se em punir, não pode. Reduzir a maioridade? nem pensar, o negócio é só educação que tudo se resolve. Enquanto isso, nosso exército leva paz e tranquilidade aos moradores do Haiti, mas no Rio não devem atuar, porque não foram preparados para isso. O que se vê é a perpetuação de um discurso comunista que, infiltrado em nosso meio acadêmico por décadas, quer fazer crer que o problema da violência está umbilicamente e exclusivamente ligado à questão da pobreza, das diferenças socias. Óbviamente que isto não se revela verdadeiro, a miséria tem sua contribuição, por certo, mas a sociedade brasileira colhe os frutos da impunidade generalizada, do desgosto que o brasileiro tem por cumprir leis, do glamour da malandragem, de adoção da "lei de Gerson" e por aí vai. Penso que precisamos de um tempo de tolerância zero, à moda de Nova Iorque, com a efetiva punição de grandes e pequenos delitos. Não precisamos de mais leis, já existem suficientes, devem sim é sair do papel, serem cumpridas por todos. Brasileiro não gosta de lei, mas sem lei não há civilização, isto é assim desde Moisés, aliás, desde o èden, e nunca vai mudar. Só pressão sobre os nossos descansados e tranquilos políticos é que vai fazê-los se mexer, mas isso tem que ser muito contundente. Enfim, reverendo, foi só um desabafo, estou cansado e, confesso, se pudese ia embora, mas Deus assim não o quer, portanto, continuarei a apoiá-lo, conte comigo.

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  2. Pastor, acabei de ler essa matéria no jornal O Globo. Fico pensando como os políticos conseguem conviver com tamanho descaso com o nosso País. Realmente não há nada de novo no relatório, mas vindo da Anistia Internacional, pelo menos teremos esse genocídio cotidiano divulgado para o mundo formalmente.
    Concordo com o Sergio quando compara os nossos servidores como feitores de capitanias, acho que grande parte dos brasileiros vão acordar para as injustiças que estão nos angustiando, só espero que não seja tarde demais (se já não o é).

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