segunda-feira, 14 de maio de 2007

DOS DELITOS E DAS PENAS - CESARE BECCARIA (V)


Muitos fazem nos dias de hoje críticas severas a certos movimentos de defesa dos direitos humanos por julgá-los a favor do criminoso e contra a vítima. Contudo, não podemos nos esquecer do fato de que a história pregressa do Brasil e o seu momento atual estão eivados de ambos os males: a frouxidão da lei com respeito aos crimes que são praticados em larga escala, mas não apenas isto, o desrespeito por parte das autoridades à dignidade humana, em especial, a do preso. No Brasil, nossos presos são estuprados, têm que dormir em celas imundas, num calor insuportável e expostos a tantas outras violências mais que, acabam tornando-os piores do que eram.

Beccaria destaca verdades que precisamos levar em consideração quando pensamos em punir. Entendo a fome de justiça por parte de muitos, especialmente por parte dos parentes das vítimas, mas devemos fugir a todo custo de um espírito vingativo que se traduz num processo penal absolutamente iníquo. Beccaria destaca o fato de que a aplicação da lei deve ser clara: “... todo cidadão deve saber quando é culpado ou inocente”. Nada justifica uma lei difusa e aplicada de modo arbitrário. Outro ponto. A finalidade da pena não é atormentar a vida do criminoso: “O fim das penas não é atormentar e afligir um ser sensível... é apenas impedir que o réu cause novos danos aos seus concidadãos e dissuadir os outros de fazer o mesmo”. Veja que um excelente equilíbrio é apresentado pelo jurista italiano. Esta pessoa que praticou o crime não vai ser desnecessariamente afligida, contudo, será punida de uma tal maneira que a sociedade será protegida da ameaça que o criminoso representa. E, ao mesmo tempo, os candidatos em potencial para a prática do crime, chegarão à conclusão de que se levarem adiante seus intentos, farão um péssimo negócio.

Uma outra preocupação que precisamos ter, se é que não queremos criar uma sociedade vingativa e fascista, mas termos um Estado que puna de modo justo, é quanto a um elemento fundamental do processo penal, que vem a ser o papel da testemunha. Beccaria é da opinião de que a credibilidade de uma testemunha “... deve diminuir na proporção do ódio ou da amizade, ou das relações existentes entre a testemunha e o réu’. Muitas vezes o direito é torcido pela acusação leviana que destrói o bom nome de um cidadão. Os indícios do crime devem estar bem fundamentados, e, quanto maior for a independência das provas maior grau de segurança será alcançado ao se estabelecer a sentença: “Quando as provas independem umas das outras, ou seja, quando os indícios se provam por si mesmos, quanto maiores forem as provas aduzidas, mas crescerá a probabilidade do fato, pois a falácia de uma das provas não influi na outra”. Uma testemunha falsa deveria ser tratada severamente: “Mas todo governo... deve infligir ao caluniador a pena que caberia ao acusado”. Os danos que são causados à vida e ao nome do que foi acusado e sentenciado injustamente são tais que, jamais a falsa testemunha deveria escapar incólume. Ficamos a pensar na forma como em muitas ocasiões uma campanha é levada a cabo para se destruir a reputação de um homem, muitas vezes por uma simples questão de diferença ideológica.

Por causa da causa supra mencionada, um homem jamais deve ser considerado culpado antes que sua culpa esteja estabelecida por um órgão competente: “Um homem não pode ser chamado culpado antes da sentença do juiz, e a sociedade só pode retirar-lhe a proteção pública após ter decidido que ele violou os pactos por meio dos quais ela lhe foi concedida”. Sendo assim, diz Beccaria: “É inocente um homem cujos delitos não estejam provados”. Beccaria é radicalmente contrário à tortura: “Esse é o meio seguro de absolver os celerados vigorosos e de condenar os inocentes fracos”.

Um comentário:

  1. Concordo que a sociedade que na ânsia de justiça, feche os olhos às péssimas condicões que os presos estão sujeitos no Brasil. Mas infelizmente quando se afirma que “Um homem não pode ser chamado culpado antes da sentença do juiz", não podemos deixar de lembrar dos casos recentes de compras de sentenças no país.
    Fico sem esperanças de que um dia viveremos em uma nação em que todos os cidadãos tenham os mesmos direitos e deveres.

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