ESPERANÇA, LÁGRIMAS E PARTICIPAÇÃO
Nunca vivi dias tão premidos, intensos e desafiadores como estes de 2007. Iniciar o Rio de Paz, sem parar a vida como um todo a fim de me dedicar a tarefa tão complexa, dar seqüência aos programas de TV, continuar fazendo os sermões, cuidar da família, lidar com o dia-a-dia do ministério, dar continuidade às pesquisas do doutorado e me equipar intelectualmente para o envolvimento com uma área para a qual não tenho preparo adequado (falo da esfera política), confesso, não tem sido fácil.
As alternâncias de experiências emocionais têm sido a marca desta fase da minha vida. Por um lado, o encanto com o evangelho, a emoção de servir a um Deus tão excelente e de perceber que na sua Palavra tenho respostas honestas para oferecer a uma geração desorientada e que não sabe lidar com os graves problemas sociais que enfrenta. Por outro lado, o contato com a tragédia humana. Uma das experiências mais duras é ouvir os relatos repletos de angústia, revolta e saudade dos parentes das vítimas. Tenho conversado com muitos. E nesses encontros percebo que por trás de cada assassinato há uma família com uma ferida incurável no coração dos seus membros - pai, mãe, marido, esposa, filho, filha, avô, avó e assim por diante.
O choque do contato com a maldade humana é outro aspecto dessa experiência tão carregada de perplexidade. Ouço falar de estupros, animais entregues à inanição a fim de saciarem sua fome nas vítimas humanas, torturas que levam a vítima à agonia antes de ter sua vida interrompida, pais que não sabem o paradeiro dos seus filhos, mães que só querem saber que matou seus filhos, entre tantos absurdos mais. Não há miséria que explique a forma como se mata no Estado do Rio de Janeiro. A vida não é apenas ceifada, é levada ao desespero e humilhação antes de ser sentenciada à morte. Por que jogar futebol com a cabeça da vítima? Por que degolar e arrancar os seios da moça que se recusou a continuar namorando o traficante? Por que retalhar todo o corpo da vítima antes de assassiná-la? Em muitas ocasiões chego em casa e encontro dificuldade de sacar da minha mente toda essa desgraça. Nunca compreendi tanto o que leva um ser humano à loucura após voltar de um campo de guerra.
Em meio a tudo isso, uma amiga pede que eu visite seu pai em estado terminal de câncer. Um homem que conheci no auge de sua força física e produção profissional. Agora, alquebrado, sentindo dores horríveis e lutando para adquirir uma sobrevida. O telefone da minha casa toca e do outro lado da linha alguém diz que a Korina havia morrido. Korina era uma moça de 25 anos, mãe de um filho de 3, que despencou de uma altura de 30 metros com o seu carro de um viaduto na cidade de Niterói. Morte instantânea. Há muito que eu não a via, bem como seus familiares que moram no prédio onde durante muitos anos habitei com meus pais. Não havia como deixar de visitá-los. A família aos prantos. E lá estava eu, saindo dos relatos de desespero de pais que tiveram seus filhos assassinados, tentando levar consolação para uma família que estava enfrentando a tragédia para a qual o Estado não tem solução. As lutas da vida debaixo do sol.
Conclusão: a vida é dura, curta e incerta. Duramos pouco. Não posso entender como os seres humanos podem viver sem esperança, descartar o cristianismo sem ao menos haver parado para considerá-lo. Lembro-me da aposta de Pascal: "Aposte tudo em Deus. Se você ganhar, ganhou tudo. Se você perder, não perdeu nada". Graças a Deus o cristianismo não é uma aposta porque Jesus ressuscitou. Por isto investimos tudo no seu reino. Quão tolo é aquele, por outro lado, que corrompe, mata e destrói. Corre atrás do vento. Dedica-se com ardor àquilo de que um dia haverá de se separar, pois mais alguns verões, mais alguns outonos, mais alguns invernos e mais algumas primaveras e todos teremos que dizer adeus ao que tanto valorizamos e pelo que fizemos tanta loucura e cometemos tantas afrontas aos céus.
Penso no Estado e no seu papel. Bem que ele poderia servir para atenuar todo o sofrimento que nos assola, impedir que dores desnecessárias fossem acrescentadas à vida. Nossa existência se dá em meio a inúmeras dores e incertezas, e, nós, no Brasil, a tornamos inviável por havermos permitido surgir uma nação tão desumana e em nada promotora e preservadora dos direitos humanos.
O que cabe a todos nós fazer? Sair em busca de uma esperança. De algo que seja maior do que uma nação possa oferecer. Buscarmos a certeza de que a vida não termina no túmulo e que há sentido na história. Essa esperança tem que ter uma base intelectual adequada. Não pode funcionar como uma droga que alucina. Tem que consolar o coração a partir de premissas muito bem fundadas. Nunca encontrei nesta vida porto mais seguro do que Cristo. Mais do que tudo nele pude encontrar. Sua história haveria de requerer a existência de um Cristo para ser inventada. Que Deus é esse que pune nossos pecados na pessoa do seu Filho amado a fim de que sejamos salvos? Há uma prova estética nisso tudo. O argumento da beleza. Esse Deus é o único Deus verdadeiro em razão da sua incomparável beleza. Mas, precisamos agir também. Firmados nessa esperança que empresta sentido à nossa vida, saiamos para tornar o vale de lágrimas que é esse mundo em que vivemos num lugar que seja melhor do que é, ou, não tão ruim quanto poderia ser (ou quanto tem sido). Que tornemos o nosso país uma nação onde as aflições comuns a todos os mortais sejam mitigadas por um Estado que confira dignidade à vida humana. Mas, não apenas isso, enquanto lutamos por um país justo, que mantenhamos os nossos olhos fitos na esperança que nos foi trazida pelo evangelho: "E lhes enxugará dos olhos toda lágrima, e a morte já não existirá, já não haverá luto, nem pranto, nem dor, porque as primeiras coisas passaram".
Antonio Carlos Costa
Só mesmo Deus para consolar todas as vítimas de atos tão cruéis. Não conseguia sequer imaginar tanta perversidade.
ResponderExcluirQue Deus te fortaleça todos os dias para que continue esse bonito trabalho.
Aliás, ontem vi o Starte na Globonews, cujo tema era a manifestação de cidadania como expressão artística. O trabalho do Rio de Paz ilustrou e encerrou o programa com bonita entrevista com o pastor. Parabéns mais uma vez!
Muito interessante seu comentario.
ResponderExcluirAcho que uma das solucoes seria dar mais educacao para este povo, ensinar os alunos a lerem mais e buscarem no ensino algo que eles nao encontram em lugar nenhum.
Cristo esta Vivo!!! Sim, entao ensinemos, evangelizemos e procuremos dar carinho e amor as criancas e aos jovens.
Irmao, parabens pelo seu trabalho, ele e digno e voce e nos iremos colher os frutos brevemente. Com uma cidade melhor de se viver.
A Paz de Cristo.
Caro Rev. AC, tenho acompanhado o trabalho do Rio de Paz via noticiário. Sinceramente não tenho respostas ou idéias para auxilia-lo. moro em Juiz de Fora, uma cidade mineira, ainda pacata. Sou carioca de nascença e ver o que ocorre no Rio, hoje, me doi profundamente, principalmente a perda do valor da vida. Oro por vcs pro que o começo de tudo começa em Jesus. Falo começo pois creio que nosso chamado, como servos implica em algum tipo de ação prática, como testemunho.
ResponderExcluirNão esmoreça pois o RJ tem um remanescente fiel...
Um abraço
Presb. Alexandre Almeida