segunda-feira, 9 de abril de 2007

OS MIL CARIOCAS DEITADOS NO CALÇADÃO DE COPACABANA

Creio que nesses últimos anos, em poucas ocasiões, o brasileiro pôde ver cena tão comovente quanto a que foi vista na praia de Copacabana neste último sábado. Mil cariocas tomaram a decisão de atender a um apelo em favor da paz. Toda essa gente, no meio de um feriado de páscoa, sob sol escaldante, vinda de todos os pontos do Grande Rio, decidiu se deitar, em meio a dejetos de animais, numa calçada quente, para dizer que não quer viver num Rio de Janeiro onde o sangue do carioca não vale nada – um Estado que permitiu que 1000 cidadãos seus fossem assassinados em menos de três meses.

O que esta Auschwitz representa? Em primeiro lugar, uma ameaça à democracia. Brasileiros estão começando a duvidar de que a democracia seja o melhor sistema de governo que existe. Isto porque nossa democracia é democracia sem ordem, e por isso estorva o progresso. O sistema de governo menos ruim que existe, a democracia, está sendo ameaçado no Brasil pelo menosprezo à vida e corrupção de uma geração de brasileiros incrivelmente cruéis e apáticos. Há o brasileiro perverso, que mata, corrompe e explora. Há o brasileiro gente boa, mas inerte. Brasileiro que não compreende, conforme ressaltou Edmund Burke, que, “para que o mal triunfe, é necessário apenas que os homens de bem permaneçam inativos”.

Essa crise na segurança pública expõe a nação ao perigo de uma guerra civil. Estamos dando margem ao surgimento de algo fascista, perverso, violento, antidemocrático que encontre sua justificativa na nossa desordem, insegurança e corrupção. Se, hoje, alguém parar o trânsito do Rio de Janeiro em protesto contra a violência, quem vai poder lhe dizer que ele está errado? Especialmente se essa pessoa for parente de vítima assassinada, ou pai de um garoto morto por meio dessa coisa perversa, maligna e indecente chamada bala perdida.

Mas o pior de tudo é a vida que foi ceifada. E o pai, a mãe, o filho, a filha, o irmão, a irmã, o marido, a esposa, o amigo, a amiga, que estão envelhecendo antes do tempo, após terem enterrado alguém por quem eram capazes de dar a vida e, que contudo, teve sua vida interrompida pelo crime.

Por tudo isso e muito mais, afirmo que o que houve em Copacabana neste último sábado foi grandioso. Nenhuma desordem. Famílias inteiras reunidas. O pai deitado ao lado da mãe e dos filhos. Pessoas de todas as camadas sociais. Moradores de condomínios da Barra da Tijuca e cidadãos do município de Nova Iguaçu que chegaram em três ônibus lotados. Gente idosa ao lado de adolescentes. Cidadãos cariocas completamente diferentes e unidos – estava lá o Tico dos Detonautas com sua pele cheia de tatuagem ao lado do crente pentecostal que jamais tatuaria o seu corpo. O cristão de igreja evangélica que orava enquanto permanecia deitado ao lado daquele que não se imagina dentro de um templo protestante. Parentes de vítimas ao lado de pessoas que decidiram não esperar ver um filho levar um tiro para aprender a ser gente.

Para muitos, pessoas ingênuas. Porém, ingênuos que amam e participam. Que no seu interesse pela vida não conseguem ficar em casa filosofando sobre a dor ou assistindo ao faroeste pela televisão. Homens e mulheres que, em vez de empunharem armas, causarem o caos, se insurgirem contra as autoridades constituídas pelo Estado de Direito, preferiram deitar naquele calçadão na esperança de nunca mais precisar fazê-lo. Cidadãos brasileiros que revelaram seu interesse pela justiça e capacidade de protestar de modo inteligente e pacífico.

Antonio Carlos Costa
Rio de Paz

6 comentários:

  1. Pastor,
    Com certeza foi algo comovente e sei que muitos abdicaram de seu tempo para estarem lá. Eu e meu marido deixamos de viajar com a família e foi a decisão mais acertada que tomamos. Amanhã devo comparecer na passeata do centro, espero que mais cariocas e fluminenses se unam às manifestações.
    Meus parabéns pela iniciativa tão nobre em criar a ong Rio de Paz.

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  2. Caro Antônio Carlos,

    Lamento a falta de comentário, mas como não sou do Rio de Janeiro, prefiro não opinar a respeito.

    Na verdade estou tentando contatar contigo para ver sua disponibilidade de vir a Florianópolis em Outubro para um evento da Igreja Presbiteriana na Trindade.

    Por favor, faça contato enviando mensagem para iptrindade@iptrindade.org.br e informe seu telefone que faremos contato.

    Um forte abraço.

    Ciro Aimbiré de Moraes Santos

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  3. Este comentário foi removido pelo autor.

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  4. Prezado Antônio Carlos,
    Parabéns pela iniciativa criativa e impactante.
    Há tempos esperava por participar de algo que pudesse
    ser a voz do povo demonstrando que não estamos alheios aos acontecimentos sem contudo causar desordem ao expor isso.
    Eu, meu esposo e meu filhinho Daniel, de apenas 4 anos, estávamos lá, debaixo do sol quente, deitados no calçadão na esperança de que pode haver mudança e que contribuímos para isso.
    Parabéns! Continue o bom trabalho.
    E conte conosco!

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  5. Gostaria de agradecer ao Nosso Deus pela vida de todos vocês que mostram com esse Movimento, que crente também tem sangue e não vive só de triunfalismo à espera de um céu no futuro onde tudo se resolverá.
    Continuem! Não desistam!
    Que o Grande Eu Sou esteja com vocês!
    Podem ter certeza de uma coisa: Papai se alegra e vibra em ver que Seus filhos se importam com a Terra e com os que nela habitam!
    Se somos feitos a Sua imagem e semelhança, então temos que ativar e deixar fluir esta natureza em nós.
    Shalom
    Leila Barros de Mattos Vasconcellos
    leilabmvasconcellos@gmail.com

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  6. Pastor
    Parabéns pela iniciativa, pois como cristãos, não temos que ficar à espera que bandidos se ''convertam'' para acabar a violência, pois isto demoraria muito, e muitos inocentes e chefes de família se perderão, só com falácia.
    Deus o abençoe!

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